domingo, 19 de abril de 2009

Contrastes

Claudia encarava a vida como um jogo de pôquer. Todos eram adversários em potencial. Era uma grande jogadora e sabia quais trunfos usar: Mascarar emoções e observar atentamente os sinais. Aprendeu muito cedo a usar essas armas. Desde o tempo em que vendia flores nos bares de Cidade Baixa. Tinha sempre um sorriso no rosto, uma frase feita e seduzia com ar inocente. Assim aprendeu as manhas da vida e como extrair prazeres evitando a dor.
Não era uma mulher linda, daquelas de parar o trânsito, mas sabia usar a feminilidade com maestria. Tinha cabelos e olhos negros e uma pele alva que lhe dava uma aparência entre gótica e clássica. Usava maquiagem suave e adornos discretos. Parecia saída de um filme, de tanta perfeição. Uma matadora. Colecionava corações como se fossem selos. Usava os homens ao seu bel prazer. Desfrutava do melhor da vida. Ganhava muitos presentes de seus admiradores, mas nunca se vendeu. Era orgulhosa demais para isso. Apenas aceitava de bom grado as demonstrações de afeto, mas não precisava deles para viver. Tinha conseguido vencer por conta própria.
Numa noite estava sentada em um bar e ria dos homens que disputavam ferozmente a honra de pagar-lhe um drink. Eram vários “espécimes interessantes” pensava se decidindo quem seria o escolhido. Entre uma e outra jogada de cabelo, seus olhos se cruzaram com um rapaz na mesa do canto. Se ela parecia Gilda, ele estava mais para um nerd de cinema besteirol.
Ele estava com um grupo de amigos que volta e meia olhavam para Claudia entre risos e cobiça. Mas ele se mantinha olhando para baixo. Léo era um rapaz tímido e sem brilho. Estudava letras e era poeta nas horas vagas. Não se podia dizer que era feio, ao contrário, tinha vários encantos. Inteligente e sensível era o sonho de consumo das meninas românticas. Tinha olhos azuis escondidos por um par de óculos e uma pele morena que fazia um contraste belo. Durante todo o tempo que permaneceu no bar não desviou o olhar do copo. Talvez tenha sido o único naquele salão a passar incólume pelos encantos de Claudia.
Ela também percebeu isso e gostou da idéia de seduzi-lo por diversão. Como já tinha marcado o encontro da noite deixou a brincadeira para outro dia. Mas antes de sair se certificou que ele era freqüentador do bar. E era. Passava regularmente por lá na saída da aula.
Algum tempo se passou até que se encontrassem novamente. Claudia dessa vez estava sozinha e Léo chegou com sua trupe de sempre. Os rapazes não tiravam o olho dela, que sorria como se fizesse um convite. Não demorou para um deles vir até a mesa e se sentar. Como era um rapaz lindo e seu alvo parecia estar mais interessado na vodka, Claudia se deixou levar e esqueceu-se de Léo.
Eles se esbarraram várias vezes nos meses que se seguiram e a cena sempre se repetia.
Ela tentando seduzir e ele parecendo não ter interesse. Claudia já estava enlouquecida. Nenhum homem havia ficado imune aos seus encantos. Aquele rapaz só podia ser gay ou cego. Ela teria que tomar uma atitude que evitava a todo custo, atacar de maneira escancarada. E assim foi.
No fim de semana seguinte ela se produziu para arrasar e ficou no bar a espera de Léo. Ele não demorou a chegar com os amigos, mas dessa vez ela o encarou com desejo, e finalmente se fez notar. Os amigos de Léo o cutucavam, chamando a atenção para o que acontecia, mas ele era tímido demais para se insinuar. Ao perceber isso, Claudia esperou que ele se levantasse e foi atrás puxar conversa.
Ele a recebeu com um misto de pavor e euforia. Nunca imaginou que uma mulher como ela poderia notá-lo. Claudia o convidou para sua mesa e começaram uma longa conversa mesclada com beijos tórridos.
Era nítida a química que brotava de seus corpos. Tinham pouco em comum e a descoberta de mundos novos fez nascer um encantamento mútuo. Depois de um tempo ela se “ofereceu” para ir a casa dele e se conhecerem melhor. Claudia não era mulher de perder tempo, e mesmo um pouco assustado, Léo concordou e saíram em direção a sua casa.
Nem bem a porta se abriu ela já foi se jogando sobre ele, beijando seu pescoço e tentando desabotoar sua camisa. Léo a afastou, carinhoso, pedindo que tivesse calma. Aquilo desconcertou Claudia. “Que homem estranho” pensou antes de encará-lo com dúvidas de ter feito a escolha certa. Ele sorriu e afastou uma mecha de cabelo que caia sobre seu rosto e a tomou em um beijo terno e apaixonado. Devagar a conduziu ao quarto e cheio de carinho começou a despi-la. Claudia estava atônita, não sabia o que fazer e então se deixou levar. Cada toque dele em seu corpo era uma sensação nova e quando finalmente se deixou dominar, sentiu um prazer que jamais experimentara em sua vida.
Depois de um tempo ele adormeceu e ela não pode evitar o sorriso ao olhar aquele menino que estava deitado ao seu lado. Era mais bonito do que ela se lembrava e não podia negar que era também um amante “de primeira”. Pensou em quebrar sua regra número um de nunca repetir homens, mas logo mudou de idéia e levantou para se vestir. Sim, tinha sido bom, mas era hora de voltar a sua vida.
Caminhou em direção a sala com cuidado para não acordá-lo e quando chegou lá acendeu a luz para procurar sua bolsa. O que viu a seguir foi um choque. Haviam desenhos dela espalhados por todos os cantos. Alguns com pequenos poemas escritos no rodapé. Ele havia captado vários momentos e reproduzido de cabeça, em horas que ela nem notava seu olhar. Era uma declaração de amor silenciosa e ao perceber isso não pode evitar as lágrimas.
Claudia olhou um a um os desenhos e ao fim sentiu uma vontade louca de voltar ao quarto e se jogar nos braços de Léo. Ela viu que podia amá-lo também que isso seria uma vida nova. Sonhos românticos começaram a povoar sua mente e derreter seu coração de gelo. As lágrimas corriam soltas e estava confusa com sua reação.
Precisava pensar. Tudo aquilo era muito novo e foi ao banheiro lavar o rosto e se recompor. Ao erguer a cabeça e se encarar no espelho tudo ficou nítido de novo. Secou os olhos e retocou a maquiagem enquanto falava em voz alta como a tentar se convencer. “A vida não é um conto de fadas.” Então passou o batom decidida e voltou para a sala dando uma última olhada em seus sonhos. Bateu a porta deixando para trás o que poderia vir a ser o único amor de sua vida.
Na rua, o brilho do sol já se fazia notar e caminhou por entre os carros com uma certeza no coração. “Ninguém, jamais, tiraria dela uma lágrima sequer.”

7 comentários:

  1. Nossa vc tb escreve contos, que lindo!! adorei a história, poxa achei q Claudia fosse finalmente se render ao amor...mas na minha imaginação ela se arrependeu e voltou! hehehe
    "a vida não é um conto de fadas", às vezes, eu não tenho razão suficiente pra entender isso! rs
    Bjoss

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  2. Nossa, eu fiquei sem palavras. Parace que quanto mais lia, mais voltade tinha de saber o final da história.
    Não sei, acha mesmo que ela não volta atrás? As vezes as pessoas nos surpreendem. De qualquer forma, se ela voltar, que tenha sorte e não encontre pela casa outras imagens no lugar dos retratos dela. Vai saber..

    Lindo demais teu texto.. ;D

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  3. Que conto incrivel..
    ADoro contos..
    este conto da claudia

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  4. Quando pensei que Claudia iria Amar sem pensar nas consequecias...! Muito bom, seu conto. Parabéns.

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  5. Seu talento é digno de estar em bons livros de literaruta!

    A gente se encontra!

    Você na prateleira, eu numa livraria em busca de você!

    Beiiijos

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